segunda-feira, 6 de junho de 2011

Conjunções



  Ela tinha medo da noite. Agora tinha, mas antes não. Tinha medo da escuridão que brotava de si mesma, pálida e arroxeada. Tinha medo do vazio que a preenchia, diariamente, pelos achados vividos, ou não, que se passaram pela existência, vaga, quase vã. Tinha medo também dessa solidão qualquer que se perfazia mórbida, persistente e clara sobre seus olhos castanhos. Tinha medo de viver a noite na noite.
  Ela tinha medo do que aconteceria, tinha medo do que acontecera, tinha medo do que acontecia. Ela sentia seus pés tocando o chão, esvaindo-se, com todo o seu corpo a cair em uma abismo, negro, que lhe agradava de tão claro quanto parecia.
  Ela tinha medo do ciclo de tudo e de todos. A ela parecia que o começo se reiniciava no fim, sempre da mesma forma, repetindo-se como notas perdidas em uma vitrola quebrada. Tinha medo e não lhe bastava isso, mas só isso a pertencia.
  O que faria? Sentiria medo. Medo de só ter medo, medo de ter mais medos. Medo do próprio medo. E diante do pó que abismava sua mente, perfez leves caminhos de glória, e descobriu: ainda tinha a si mesma.
  E a noite? A noite abriria seu lunar, que aos poucos abrigaria todos os medos, como uma mãe a espera da criança sedenta de alimento. Medo tinha a noite de perder-se sem ela. Mas ela, agora, não tinha mais a noite. A noite era ela.
( E mesmo com medo de si mesma, ela não queria ser só..)

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"Cogito, ergo sum"